Entidades criticam decreto de Bolsonaro mesmo com as mudanças de regras sobre uso de armas e de munições.
O governo Jair Bolsonaro (PSL) publicou nesta quarta-feira (22), um novo decreto sobre as regras para a posse e porte de armas de fogo no Brasil. O texto altera alguns pontos do decreto assinado no dia 7 de maio, que foi questionado no Supremo Tribunal Federal (STF).
O Exército é quem irá definir por exemplo, e no prazo de 60 dias, quais armas vão poder ser adquiridas pelos cidadãos comuns. É essa listagem que vai dizer, por exemplo, se será possível ou não comprar fuzil.
Veja o que foi modificado no novo decreto
O decreto proíbe o cidadão comum de ter porte de “armas portáteis”, como fuzis. Mas diz que o Exército ainda vai publicar, em até 60 dias, a lista completa de armas que serão adquiridas ou proibidas.
O novo texto manteve a facilitação do porte para uma série de profissionais que antes não tinham esse direito sem comprovação de efetiva necessidade, e incluiu o guarda portuário entre as categorias. Já a posse foi definida em decreto de janeiro (veja no final do texto).
Porte de armas
Isso vale para todas as armas, inclusive para os fuzis. Questionado nesta quarta se os cidadãos poderão comprar fuzis, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, afirmou.
“Isso vai ser uma competência do Comando do Exército, que vai realizar essa classificação. Sobre que tipo de armamento que as pessoas podem adquirir ou não e dependendo das categorias. Normalmente, essas armas de potencial lesivo maior são restritas à utilização das forças de segurança”.
Já o porte de fuzil, que é a possibilidade de transportá-lo fora de casa, foi expressamente proibido pelo decreto.
Como é feita a definição
O decreto de Bolsonaro define três categorias de armas:
- as armas de porte (armas curtas), como revólveres;
- as portáteis (armas longas), como espingardas, carabinas e fuzis;
- e as não portáteis, que só podem ser transportadas por mais de uma pessoa ou fixadas em veículos ou em outras estruturas. Essas últimas são todas proibidas para população.
O Exército definirá, então, quais são as armas de porte (curtas) e portáteis (longas) que se enquadram entre as permitidas, as restritas e as proibidas.
O órgão responsável por isso é a Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército. Os técnicos vão analisar a energia cinética emitida e definir se aquela arma pode ser usada e por quem.
Para formular a lista do que cada um poderá comprar, os militares farão testes em simulador e testes com armas reais. Os resultados serão usados para estabelecer “parâmetros de aferição”, as regras e os critérios que definirão o que é permitido, o que é restrito e o que é proibido.
O Exército fará, ao fim, uma lista dos calibres nominais e das munições que podem ou não podem ser utilizadas. Isso porque a energia cinética varia de acordo os seguintes fatores, dentre outros:
- peso da munição;
- velocidade ao ser disparada;
- e prolongamento do cano da arma.
Será calculada a energia cinética do disparo de cada arma com cada tipo de munição, para verificar se a arma e a munição se enquadram nos critérios permitidos ou não no decreto.
Por exemplo: as munições de calibres 380 ACP, 9mm parabelum e .38 super possuem diâmetro de uma arma de 9mm. Mas algumas podem ter um comportamento balístico diferente, conforme diversos critérios de avaliação.
No fuzil, a energia cinética é maior porque a munição a ser utilizada, apesar de mais leve que as munições de outras armas, tem mais pólvora do que as demais. Além disso, devido ao prolongamento dos canos das armas, que são mais longos que o das armas curtas (como revólver e pistolas), a pressão da queima da pólvora, em alta velocidade, gera maior energia cinética.
Mudanças
Após o primeiro decreto, publicado em 7 de maio, passaram a ser permitidas para todas as pessoas e algumas categorias (como advogados, jornalistas de cobertura policial e caminhoneiros, por exemplo) a compra e o porte de pistolas de calibre ponto 40 – hoje autorizadas apenas para forças policiais – e de pistolas nove milímetros (de uso de policiais federais) e de calibre 45 (empregado pelos militares do Exército).
Entidades criticaram o decreto do presidente Jair Bolsonaro, assinado nesta terça-feira (7), que altera regras sobre uso de armas e de munições. O texto ainda não foi divulgado.
O decreto deixa claro que colecionadores, atiradores desportivos e caçadores poderão levar a arma carregada quando estiverem se deslocando de casa ou do trabalho até o local de prática do esporte ou exposições para facilitar a defesa pessoal, o que entidades e alguns especialistas consideram perigoso.
Para o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a” medida é claramente uma tentativa de driblar o Estatuto do Desarmamento (…) e ignora estudos e evidências que demonstram a ineficiência de se armar civis para tentar coibir a violência em todos os níveis”.
Em nota, a entidade destacou ainda que, “além de contrariar a legislação atual, o decreto carece de uma análise do Congresso Nacional, e parece ter sido feito sob medida para agradar alguns eleitores do atual presidente da República, que dá sinais claros de realmente acreditar que Segurança Pública começa dentro de casa”.
Por fim, o Fórum sustenta que o governo federal deveria “trabalhar para identificar as razões que levaram à queda dos homicídios em 2018, e assim documentá-las para serem replicadas, ao invés de insistir na aposta de receitas comprovadamente equivocadas para o setor”.
Também em nota, o Instituto Sou da Paz afirmou que “há muito a ser feito para a diminuição da violência e criminalidade no Brasil”. Disse ainda que “insistir em medidas que facilitem a compra e circulação em vias públicas de armas –e em medidas que sobrecarregam as instituições públicas em prol do benefício de um pequeno grupo– só irá piorar o grave cenário da segurança pública enfrentado pela população brasileira”.
Illona Szabó de Carvalho, diretora-executiva do Instituto Igarapé, alertou para o risco de mais armas e munições nas ruas.
“Na lei, hoje, você não tem a marcação de munição para civis como regra. Então, esta deveria ser a proposta do presidente da República. Marcação de armas e munições e munições em lotes muito menores para que a gente possa de fato rastrear”, disse. Só então, diz ela, seria possível verificar se essas pessoas realmente possam ter armas.
“Que seja feita, na verdade, uma fiscalização para que, se houver qualquer desvio, essas pessoas também possam ser penalizadas. Porque, novamente, isso não é um direito; arma é um privilégio. A gente precisa discutir isso. A nossa Constituição em lugar nenhum diz que a gente tem o direito a ter armas; diz que a gente tem o direito à Segurança Pública. E a gente sabe que, quanto mais armas em circulação, mais mortes por armas de fogo.”