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Qual o nosso legado?

*Augusto Bernardo Cecílio

Na Era Temer um servidor público me perguntou por que eu era tão contra a reforma da Previdência. Poderia nem responder, até porque o servidor, que será tão afetado, é quem deveria me dizer por que é tão a favor. Primeiro, além das mudanças agressivas que tentam impor, é altamente questionável o que eles chamam de rombo, principalmente com a “facilidade” com que fabricam números, sem sequer terem em mãos um levantamento minucioso da situação e um cálculo atuarial.

Segundo, os direitos atuais foram conquistados a duras penas por gerações passadas e nós estamos entregando de mão beijada. E quem questiona passa a ser mal visto pelos adoradores do poder. Que explicações daremos aos nossos filhos e netos sobre o nosso comportamento entreguista?

Terceiro, eles não ficarão contentes em somente arrancar esses direitos. Voltarão para buscar o resto. Lembra quando compararam direitos com jabuticabas? Vale recordar o poema que diz: “Na primeira noite eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem: pisam as flores, matam nosso cão, e não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada”.

Uns dizem que a sociedade tem urgência na aprovação da reforma. Mas que sociedade? Certamente não é a classe trabalhadora que anseia por tais mudanças, visto que ninguém em sã consciência iria trabalhar por algo que afetaria os seus direitos e prejudicaria ou dificultaria a sua aposentadoria.

Outra parte da sociedade, a que envolve os atores do chamado mercado financeiro, está vibrando, muito interessada na chamada previdência complementar e a tão sonhada capitalização, que pode aparecer novamente lá na frente, na hora da votação no plenário da Câmara, tal qual a inclusão dos estados e municípios.

Quando se pede pra população fazer um sacrifício pelo país, ficam de fora os detentores do poder econômico e político, apesar de sabermos que o tal sacrifício deveria valer para os três poderes, civis e militares. No entanto, a proposta dos militares está hibernando na Câmara, não andou, enquanto que a nossa corre com extrema velocidade. Reforço o que dizem nas ruas: se a reforma fosse boa, os militares estariam incluídos.

Claro que a tal “sociedade interessada” não está nem um pouco ligando se repetiremos o que acontece no Chile, onde os aposentados estão recebendo baixos valores e se suicidando, desesperados.

Deu pra perceber o interesse do grande empresariado nessa aprovação, principalmente dos banqueiros e financeiras (aqueles mesmos que lucram milhões anualmente à custa de juros absurdos cobrados nos atrasos dos pagamentos dos cartões e nos cheques especiais).

Afinal, algum detentor do poder político anda criticando as altas taxas de juros praticadas no Brasil? Alguém anda falando que baixar os juros seria fundamental para o Brasil crescer? Alguma montadora de automóveis está lutando para baixar os preços dos combustíveis no Brasil? Alguém fala em reforma política ou bancária por aqui? Claro que não. Isso não interessa a eles. O lucro e as riquezas interessam. Como é mais fácil cortar do trabalhador, nem tocam nas demais reformas, pois a fixação é somente a previdência do brasileiro.

Enfim, considerando que muitos do grande empresariado herdaram a empresa ou a grana dos seus antepassados, fica fácil ser a favor, até porque jamais precisarão se aposentar e nunca terão problemas financeiros.

*Auditor fiscal e professor.

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