
O autor da lei de desoneração da folha de pagamentos e setores beneficiados por ela criticaram a proposta apresentada nesta quinta-feira (28) pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) de reoneração gradual da folha de pagamentos de 17 áreas da economia.
Segundo Haddad, o governo federal vai editar, ainda em 2023, uma medida provisória (MP) com a reoneração gradual da folha, setor por setor. Além dessa alternativa à desoneração, serão propostas outras medidas para organizar o orçamento público para 2024, ano a partir do qual o governo pretende zerar o déficit fiscal.
O autor da lei, senador Efraim Filho (União-PB), disse que a edição da MP contraria decisão do Congresso Nacional e vai sofrer resistências.
“A edição da MP contraria uma decisão tomada por ampla maioria pelo Congresso. Vai sofrer resistências desde a largada. Traz insegurança jurídica para o empreendedor, que no dia 01/01 ficará sem saber qual regra seguir, se a da MP ou da lei aprovada pelo Congresso e hoje publicada”, escreveu o senador (foto principal) pelas redes sociais.
Além disso, Efraim pontuou que a MP não seria o melhor caminho, mas, sim, um projeto de lei (PL) com essas propostas de alteração, dando tempo e prazo para o debate nas duas Casas.
Por ter força de lei e vigência imediata, a MP deverá substituir a lei promulgada. Em seguida, ela ainda precisa ser analisada pelo Congresso dentro de 120 dias quando da retomada dos trabalhos legislativos, em fevereiro.
A relatora do projeto na Câmara, deputada federal Any Ortiz (Cidadania-RS), também reagiu negativamente à proposta e reforçou que ela causa “enorme insegurança jurídica”.
Na coletiva em que anunciou a medida, Haddad rebateu a tese de que estaria “afrontando” o Congresso.
“Não existe isso. O que existe, desde o começo, é o discurso oficial da AGU (Advocacia-Geral da União), do Ministério da Fazenda, da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) de que a matéria, da maneira como estava sendo tratada, era inconstitucional”.
O conjunto dos 17 setores ainda aguarda a publicação da MP para proceder à análise técnica do texto. Uma nota conjunta deverá ser divulgada, mas algumas entidades já vêm apresentando manifestações.
Setores rebatem
Em nota, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) disse que limitar a desoneração da folha de pagamentos, reduzir ou até mesmo acabar não é adequado para a prosperidade da economia brasileira.
“A desoneração foi uma conquista não apenas dos 17 setores impactados, mas de todo o país, que tem nesta medida a segurança jurídica tão necessária para o setor produtivo e o estímulo ao emprego que o Brasil precisa. Qualquer movimentação do governo no sentido contrário será prejudicial à toda a população”, disse a entidade.
“A CBIC reconhece a necessidade e o empenho do governo para melhorar sua eficiência e equilibrar as contas públicas. Mas não é coerente colocar em risco milhares de postos de trabalho para isso. Não há mais espaço para aumentar os encargos sobre a população e sobre as empresas. O país precisa de desenvolvimento e empregos, e o aumento de impostos e encargos vai trazer o caminho contrário”, concluiu a CBIC.
A presidente da Federação Nacional de Call Center, Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática (Feninfra), Vivien Mello Suruagy, criticou a condução do tema pelo governo.
Para a executiva, o pronunciamento feito pelo ministro trouxe muitas dúvidas ao não especificar o modelo e os percentuais que serão adotados para tributação da folha.
“Nos causa estranheza a proposição de uma MP apenas poucos dias após o Parlamento ter derrubado o veto presidencial à lei que estendeu a desoneração da folha até 2027, e no mesmo dia em que o presidente do Congresso promulgou a medida. A decisão da maioria dos congressistas foi democrática e deu um direcionamento claro do que deseja a sociedade brasileira neste quesito”, disse Suruagy.
“Além disso, a reforma tributária recém aprovada estipulou prazo de 90 dias para uma segunda etapa de discussões, que incluirão uma proposta definitiva sobre a tributação do renda e do trabalho.”
A Desoneração
A desoneração começou a ser implementada no primeiro governo de Dilma Rousseff (PT), em 2011, para estimular a geração de empregos, e teve sucessivas prorrogações desde então.
Buscava-se aliviar encargos para 17 setores da economia. Entre eles indústrias têxtil, de calçados, máquinas e equipamentos e proteína animal, construção civil, comunicação e transporte rodoviário. Esses setores somam cerca de 9 milhões de trabalhadores.
Este ano, o Congresso analisou o projeto que estendia a prorrogação por mais quatro anos. Isso porque a lei que estava em vigor mantinha essa desoneração apenas até dezembro de 2023.
No fim de novembro, o presidente Lula (PT) vetou o projeto de lei aprovado pelos parlamentares, que prorrogava a desoneração da folha até dezembro de 2027.
Em reação, o Congresso derrubou o veto presidencial e garantiu a extensão da desoneração por mais quatro anos. Também na quinta-feira, o Congresso promulgou a lei de prorrogação da desoneração, com assinatura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
A equipe econômica, no entanto, alega que o texto é inconstitucional e propôs a MP como opção. O governo não descarta, porém, judicializar a questão.
“Nós temos uma compreensão de inconstitucionalidade dessa lei [de desoneração] e estamos indo por um outro caminho, que é revogar a lei por meio de uma medida provisória. Pode haver litígio, mas aí é um passo de cada vez”, explicou o secretário Robinson Barreirinhas.
Na prática, a desoneração representa uma redução nos encargos trabalhistas pagos pelas empresas dos setores indicados no projeto. No padrão atual, essas companhias pagam 20% na contribuição previdenciária, como é conhecida a folha de salários. Já com a regra diferenciada, as empresas pagam de 1% a 4,5% incidindo na receita bruta.