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Alternância mais prolongada entre períodos de seca e cheia gera riscos para amazonenses

A alternância mais prolongada entre períodos de seca e cheia, chamada de pulso de inundação, nos rios amazônicos compromete a disponibilidade de água necessária para lavouras e abastecimento de municípios e comunidades ribeirinhas.  

A análise é da pesquisadora Maria Teresa Fernandez Piedade, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia).

Ela expôs a situação no Seminários da Amazônia que abordou a importância das interações bióticas em áreas úmidas da região e os riscos que essas alterações na disponibilidade de água representam para a segurança alimentar e hídrica das comunidades na Amazônia.

A mudança no pulso de inundação afeta o regime dos rios sobre as várzeas, igapós e igarapés, ecossistemas fundamentais para a reprodução de espécies, abastecimento de água e produção de alimentos.

Conforme a pesquisadora, os novos padrões do pulso de inundação dos rios estão alterando ciclos ecológicos vitais e colocando em risco a subsistência de milhares de pessoas que dependem diretamente do pulso natural das águas para plantar, pescar e acessar água potável.

Segundo Maria Teresa, 30% da Amazônia pode ser classificada como área úmida, o que representa ambientes de elevada importância ecológica e social. Dentro dessas áreas, aproximadamente 750 mil km² correspondem às várzeas e igapós – zonas que sofrem alagamentos periódicos e abrigam espécies adaptadas a essas condições específicas.

Além disso, 1 milhão de km² abrangem pequenos igarapés, sendo que 80% dos que existem em Manaus estão impactados por poluição e mudanças nos padrões hídricos.

“Essas transformações já eram esperadas. O que estamos vendo é o achatamento e o deslocamento dos ciclos hidrológicos, muitas vezes com cheias chegando antes do previsto ou secas mais longas, o que afeta desde a reprodução dos animais até a segurança alimentar das populações”, afirmou a pesquisadora.

Maria Teresa disse que a mortalidade de espécies arbóreas tem aumentado em áreas de várzea devido à inundação prolongada, e que há prejuízos visíveis também na reprodução de animais, como as tartarugas, que se deslocam para locais tradicionais de desova, mas são surpreendidas por alterações abruptas nos ciclos das águas.

Segundo a especialista, as mudanças climáticas fazem parte de processos naturais, porém, a magnitude recente dessas alterações e os impactos que elas têm provocado vêm comprometendo a segurança alimentar, hídrica e ecológica da região, favorecendo, inclusive, a proliferação de espécies exóticas em detrimento das nativas.

O grupo de pesquisa MAUÁ, liderado por Maria Teresa, tem realizado inventários florísticos e estudos de interações, como, por exemplo, entre peixes e plantas das áreas alagáveis, para estudar formas de mitigar esse desequilíbrio e preservar a biodiversidade local.

A pesquisadora também demonstrou preocupação com a ausência do tema “segurança hídrica” como prioridade em pautas internacionais, como na COP30, apesar de seu papel crucial para o bem-estar das populações amazônidas. Para ela, a segurança alimentar está intrinsecamente ligada à conservação dos recursos hídricos, e qualquer interferência nesse equilíbrio pode gerar consequências graves em cascata – desde a alteração de cadeias alimentares até a inviabilização de práticas tradicionais de manejo.

O grupo de pesquisa liderado por Maria Teresa expandiu o monitoramento para além das áreas próximas a Manaus, como o Tarumã e a Marchantaria, estabelecendo pontos de observação em diferentes regiões da bacia amazônica.

A análise comparativa dessas áreas tem revelado que os efeitos observados localmente estão, de fato, se repetindo em outras localidades –  o que reforça a urgência de políticas públicas e ações sustentáveis voltadas à proteção das áreas úmidas e das comunidades que delas dependem.

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