Além disso, as mudanças climáticas na Amazônia podem levar a perda de até 50% da vazão dos rios, aponta estudo.Os impactos na vazão serão mais intensos nos rios Juruá, Purus, Tapajós e Xingu, todos afluentes do Rio Amazonas.

A Amazônia vive um momento-limite. É o que aponta o relatório “Private Sector Roadmap for a Sustainable Amazonia”, elaborado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e pelo BID Invest.
O estudo reúne dados ambientais, sociais e econômicos que mostram uma região próxima do colapso ecológico, mas também no centro de uma das maiores oportunidades econômicas do século.
Em outro estudo, as mudanças climáticas, agravadas pelo aquecimento global, vão afetar a segurança energética do Brasil. A região amazônica será a mais afetada, com queda de até 50%, seguida das regiões Norte e Nordeste, que, na média, terão um recuo de até 40%. (detalhes abaixo).
Com 8 milhões de km², a Amazônia concentra mais de 10% da biodiversidade terrestre do planeta e armazena entre 250 e 300 bilhões de toneladas de carbono, volume equivalente a até 20 anos das emissões globais de gases de efeito estufa.
Apesar disso, o relatório mostra que entre 17% e 18% da floresta primária já foi destruída, enquanto 38% da área remanescente apresenta algum grau de degradação, causada por queimadas, extração ilegal de madeira, mineração e secas extremas.
Os dados reforçam um alerta recorrente da ciência: se a perda florestal atingir entre 20% e 25%, a Amazônia pode ultrapassar um ponto de não retorno e se transformar em uma paisagem semelhante a uma savana seca, com impactos diretos sobre o regime de chuvas, a produção de alimentos e o equilíbrio climático da América do Sul.
Pressão humana cresce junto com o risco climático
O relatório Private Sector Roadmap for a Sustainable Amazonia também chama atenção para a dimensão humana do problema. A Pan-Amazônia abriga hoje 47,6 milhões de pessoas, cujas vidas e meios de subsistência dependem diretamente da floresta.
Na Amazônia Legal brasileira, a população cresceu de 7,1 milhões em 1970 para 26,7 milhões em 2022, passando a representar 13% da população nacional.
A urbanização acelerada agravou o desafio: em 1980, 45% dos moradores viviam em cidades; no início dos anos 2000, esse percentual ultrapassou 70%, pressionando infraestrutura, serviços públicos e o mercado de trabalho.
Ao mesmo tempo, o estudo destaca que nunca houve tanta demanda global por bioeconomia, créditos de carbono, restauração florestal e produtos de base biológica, um mercado estimado em centenas de bilhões de dólares por ano.
Para o BID, o futuro da Amazônia não passa apenas pela conservação, mas pela construção de um novo modelo econômico, capaz de gerar renda, empregos e estabilidade climática.
Confira o estudo na íntegra:
Amazônia pode perder até 50% da vazão dos rios
As mudanças climáticas, agravadas pelo aquecimento global, vão afetar a segurança energética do Brasil. A conclusão faz parte do estudo “Impacto da Mudança Climática nos Recursos Hídricos do Brasil”, da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que aponta redução média nas vazões dos rios de todo o país até 2040.
A região amazônica será a mais afetada, com queda de até 50%, seguida das regiões Norte e Nordeste, que, na média, terão um recuo de até 40%.
O estudo aponta ainda que as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste deverão ter reduções de até 10%. De acordo com o levantamento, a redução na vazão dos rios é causada pelo aumento da temperatura, pela alteração no regime de chuvas e pelo crescimento da evapotranspiração, quando há perda de água do solo e da vegetação para a atmosfera, intensificada pelo calor.
Segundo especialistas, o volume de chuvas impacta diretamente a vazão média dos rios e, por consequência, a geração de energia das hidrelétricas, que hoje somam 43,7% da capacidade instalada, de acordo com dados do Operador Nacional do Sistema (ONS).
No geral, o levantamento aponta que as mudanças climáticas podem impactar, de alguma forma, 90% da potência instalada e planejada das hidrelétricas do país, com a redução das vazões médias afluentes. “
A ANA e UFRGS alertam para a região Norte. “Dentre os empreendimentos existentes, os maiores impactos se concentram nas usinas com maior potência instalada, a maioria delas localizada na bacia amazônica”, diz o estudo. O levantamento aponta que os impactos na vazão serão mais intensos nos rios Juruá, Purus, Tapajós e Xingu, todos afluentes do Rio Amazonas. “Enquanto a precipitação pode reduzir entre 10% e 15% na região, a vazão média pode diminuir até 50% nas bacias dos rios Xingu, Juruá e Purus”, exemplifica o estudo.
O Xingu conta com a usina de Belo Monte, uma das maiores do mundo. “A água é o elemento mais sensível e imediato por meio do qual os impactos das mudanças climáticas se manifestam”, diz o documento. O levantamento lembra que pode ocorrer aumento do grau de intermitência (rios totalmente secos em períodos do ano) na Região Nordeste. “Além disso, espera-se um aumento (de até dois meses) na duração de períodos de escassez hídrica, quando a vazão disponível no rio é menor que a atualmente utilizada como referência no planejamento dos usos da água”, aponta.
O estudo lembra ainda que não há apenas impacto na geração de energia elétrica. A mudança no regime de chuvas vai afetar em cheio a agricultura. O levantamento aponta que 90% da agricultura atualmente é irrigada por pivôs. O estudo cita impactos ainda em 10% do cultivo de arroz e em 90% do cultivo de sequeiro (algo que depende da chuva para a agricultura, sem irrigação). “O aumento da frequência e intensidade dos extremos, associado às mudanças climáticas, evidencia que gerir a água de forma sustentável e adaptativa não é apenas uma medida técnica, mas uma necessidade estratégica para garantir segurança hídrica, alimentar, energética e ambiental no Brasil.”
Com os eventos climáticos extremos se tornando cada vez mais frequentes, o estudo lembra também do grande volume de chuvas em curto período de tempo. As projeções mostram aumentos na chuva máxima em todos os centros urbanos, com a região Sul indicando alta entre 5% e 25%, enquanto as regiões Norte e Nordeste “indicam as maiores projeções de alteração”, com aumento de pelo menos 40% na chuva máxima de um dia.


