
O governo de Lula ainda nem começou, mas já mostra a sua cara. Equipe de transição maior da história com mais de 300 integrantes, furo do teto de gastos, criação de mais ministérios – mais de 30 -, inchaço da máquina pública e agora com apoio da bancada amazonense no Senado, a volta do extinto quinquênio, um benefício que dá uma gratificação de 5% ao funcionalismo público a cada cinco.
A PEC do quinquênio, como é conhecida, define a parcela adicional por tempo de serviço (ATS) de 5% a cada cinco anos de atividade aos juízes, promotores, defensores públicos e membros dos tribunais de contas. O acréscimo não está sujeito ao limite do teto de constitucional de R$ 39,2 mil.
A farra com o dinheiro público tem apoio dos senadores amazonenses Plínio Valério (PSDB) e Eduardo Braga (MDB), que tem seus nomes como autores da PEC, juntamente com outros 37 senadores.
Braga adiantou que “está avaliando com a bancada [do partido]” e, por isso, deve acompanhar o que for definido pelo MDB.
Omar Aziz (PSD) deu uma condição para o voto favorável: “o Judiciário não pode pedir aumento suplementar” ao orçamento.
O congressista afirmou que foi procurado por membros dos ministérios públicos estaduais e federal, desembargadores, tribunais de contas, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e todos foram unânimes ao afirmar que tinham recursos para conceder o aumento aos servidores sem que fosse necessário um ajuste nos valores recebidos pelos órgãos.
De acordo com o texto, será criado o adicional (extinto 2006) de 5% do subsídio a cada cinco anos de atividade, podendo chegar ao máximo de 35%.
Poderá ser incluído na contagem o tempo de serviço em cargos públicos de carreiras jurídicas e na advocacia, inclusive aquele prestado antes da publicação da PEC. A medida também se estende a aposentados e pensionistas.
Impacto orçamentário
O projeto está em tramitação desde 2013, mas estava parado no Senado desde 2014. Somente em 2019 voltou a pauta do Congresso, após um requerimento, da senadora Juíza Selma, solicitando o desarquivamento da matéria.
Após ser postergado por conta do período eleitoral, o projeto voltou à pauta na última quarta-feira, mas foi retirado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.
O relator da PEC, senador Eduardo Gomes (PL-TO) pediu para aprofundar a matéria e prevê a aprovação para antes do início do recesso. Uma das cobranças para retirada de pauta foi a apresentação do impacto orçamentário do projeto.
Para a reportagem, o senador Omar Aziz lembrou que, mesmo com a aprovação no Senado, o projeto precisará da aprovação na Câmara dos Deputados e terá um novo turno de votação entre os senadores caso haja alterações.
Inclusão
O líder da bancada do Amazonas no Congresso chegou a indicar uma emenda a PEC, em junho deste ano, para a inclusão dos servidores da administração tributária.
Ou seja, quem atua na Receita Federal e secretarias da Fazenda também seriam beneficiados. Inicialmente, o adicional seria concedido somente aos membros do Judiciário e dos ministérios públicos, mas com as alterações também deve alcançar as defensorias públicas e tribunais de contas.
“O que não é certo é você fazer essa emenda à Constituição e daqui a três meses o cara estar atrás do governador. Tem que condicionar isso no texto”, reforçou Omar ao dizer que há também a necessidade de aprovar ainda o Projeto de Lei 2721/2021 que acaba com os supersalários, condição que havia sido dada pelo presidente do Senado. O PL, porém, aguarda definição do relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desde agosto.
Pacheco
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, na sessão de quarta-feira, afirmou que a PEC 63 é uma antiga reivindicação para reestruturação da carreira da magistratura. Disse que a ideia é conjugar esta PEC com a aprovação, também, do PL 2.721/2021, que combate supersalários de agentes públicos, ao disciplinar o pagamento de auxílios que driblam o teto constitucional. Para ele, a reestruturação vai evitar que magistrados no final da carreira recebam menos que magistrados iniciantes.
“É um compromisso com a Justiça brasileira. É uma carreira de dedicação exclusivíssima, não podemos permitir que esta carreira seja aviltada, menosprezada, que não seja atrativa”, disse Pacheco.
Desigualdade
O sociólogo Marcelo Seráfico lembra que os quinquênios eram um meio de atualizar os salários de algumas categorias do funcionalismo público, dentre as quais se inseriam os trabalhadores do Poder Judiciário. “Tendo isso em conta, sempre foram um artifício jurídico para corrigir distorções remuneratórias.
Nesse sentido, menos que resolver o problema das perdas salariais do funcionalismo público, revelam o problema e um modo de, ao invés de resolvê-lo, mostrar privilégios de um estrato dentro dessa categoria de trabalhadores”.
O professor Ufam afirma que, ao invés dos quinquênios, o Estado, em seus três níveis, deveria adotar políticas de preservação do poder aquisitivo dos salários a partir de critérios objetivos relacionados, de um lado, às especificidades das funções desempenhadas – e da formação que elas exigem – e do custo de vida no país.
Ou seja, a política salarial do funcionalismo precisa atrair para o serviço público os profissionais capacitados ao cumprimento das funções constitucionais atribuídas aos servidores e remunerá-los adequadamente.
Responsabilidade
O defensor público-geral do Amazonas, Ricardo Paiva, disse que a proposta está sendo debatida com responsabilidade no Congresso.
“A proposta em questão é debatida com responsabilidade pelo Senado Federal, que, sem sombra de dúvida, está avaliando todos os cenários. Aos senadores cabe, nesse momento, discutir, ponderar e decidir a respeito do tema, com o discernimento que é peculiar aos membros do Congresso Nacional”.
A presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Renata Gil , lembrou o compromisso assumido pelo presidente do Senado.
“O presidente Rodrigo Pacheco, honrando o compromisso que ele firmou com a magistratura, fez uma defesa dessa reestruturação, mostrando que é importante que um magistrado que entre na carreira não tenha a mesma remuneração daquele que sai. Estamos confiantes que a Magistratura terá a valorização que merece ainda em 2022”.
As associações de magistrados do Amazonas e do Ministério Público foram procuradas pela reportagem para se manifestarem sobre a PEC, mas não responderam.


