
De janeiro a julho de 2025 ocorreram 1.535 casos de HIV/Aids no Amazonas, queda de 14% em relação ao mesmo período de 2024 (1.786 casos). Apesar da redução nos diagnósticos, o número de mortes subiu de 192 para 196 – alta de 2,08%. Os dados são da FVS (Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas).
Manaus concentra a maioria dos casos. Foram 1.168 diagnósticos de HIV/Aids nos primeiros sete meses de 2025, queda de 18,26% em relação ao mesmo período de 2024 (1.429 casos).
Em contrapartida, o número de mortes aumentou de 149 para 160, alta de 7,38%. Segundo a infectologista Ana Galdina da (FVS), a redução nos diagnósticos não significa necessariamente que a transmissão diminuiu, mas reflete falhas no diagnóstico precoce e uma “demanda reprimida” de pessoas ainda não diagnosticadas.
“Esse número de diminuição de casos não é um número real, porque há uma outra prevalência de pessoas que ainda não foram devidamente diagnosticadas. Precisamos buscar esses casos”, afirma.
O HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) ataca o sistema imunológico, responsável por proteger o corpo contra doenças. Quando o vírus não é tratado, ele pode evoluir para a Aids (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), que representa o estágio mais avançado da infecção pelo HIV.
Interior
Dos diagnósticos no estado, 367 ocorreram no interior, com 36 mortes apenas em 2025. A infectologista cita a falta de acolhimento por parte de alguns profissionais de saúde e o acesso a testes que é limitado, especialmente em municípios pequenos onde o preconceito e o julgamento social desestimulam a procura.
Outro fator é a oferta limitada de testes: “Existe um quantitativo X de testagem, ou determina um padrão de paciente que pode ser testado, então, de novo, a gente embarra na acessibilidade”, diz ela. O receio do diagnóstico também persiste, mesmo com a possibilidade de autoteste em casa.
“O receio de ter o diagnóstico ainda é um fator impactante. É uma muralha nessa busca da testagem. Então tem muita gente que fala: ‘só tem HIV quem faz teste’. Não, negativo, se você faz teste e você tem o seu diagnóstico precoce, você vai iniciar seu tratamento que depois a gente vai falar que a tua média, tua expectativa e a tua qualidade de vida vai ser tão igual quanto uma pessoa que não tem o vírus”, afirma.
Faixa etária e vulnerabilidade
A maioria dos casos ocorre entre pessoas de 20 a 39 anos. São 709 homens (46,2%) e 319 mulheres (20,8%) diagnosticados. Ana Galdina relaciona essa vulnerabilidade à falta de informação: “Mais de 90% dos jovens em Manaus desconhecem quase totalmente as ferramentas de prevenção, que incluem preservativo, PrEP e autoteste. Testar-se é também uma forma de prevenção. Ao iniciar o tratamento precocemente, quebra-se a cadeia de transmissão”.
Ela comenta que embora o diagnóstico ocorra mais nessas faixa etárias, é necessário entender que a maioria dos contágios acontece ainda no começo da vida sexual: “os mais jovens, eles estão se contaminando cada vez mais cedo”. Por isso, ela diz ser importante a educação sexual, para que falar sobre métodos de prevenção, e isso não é estimular a realização do sexo, mas “é educar para que esse indivíduo vivencie a sua sexualidade de forma segura”.
A infecção não se limita aos jovens: há crescimento de casos em pessoas acima de 60 anos. No estado, foram 37 homens (2,4%) e 10 mulheres (0,7%) , muitas vezes sem conhecimento sobre prevenção e uso de preservativo.
Em relação à transmissão sexual, 37,5% dos casos foram entre homens que fazem sexo com homens (422 casos), 34,8% em homens heterossexuais (392) e 27,6% em mulheres heterossexuais (311). Entre as mortes por Aids, a maior concentração ocorreu na faixa de 20 a 59 anos, predominando homens: 32,7% entre 20 e 39 anos e 30,1% entre 40 e 59 anos.
Histórico e mortalidade
Nos últimos dez anos, os casos de HIV/Aids no Amazonas oscilaram com períodos de aumento e queda, mas a mortalidade se manteve elevada em vários anos.
Em 2015, foram registrados 2.348 casos e 301 mortes. Em 2016, os casos caíram levemente para 2.318, mas as mortes aumentaram para 348. Em 2017, houve crescimento nos casos totalizando 2.452, com 305 mortes. Entre 2018 e 2019, os números continuaram subindo ligeiramente: 2.618 casos e 298 mortes em 2018, e 2.656 casos com 275 mortes em 2019.
Em 2020, os casos caíram para 2.260, com 299 mortes, seguidos de novo aumento em 2021, com 2.843 casos e 354 mortes. Em 2022, os casos cresceram para 2.989, com 327 mortes, antes de uma queda em 2023, com 2.800 casos e 308 mortes. Em 2024, os casos subiram novamente, totalizando 3.013, enquanto as mortes se mantiveram praticamente estáveis em 309.
Em termos de número absoluto, a capital Manaus concentra a maior parte dos casos: 1.168 em 2025, seguida de Parintins com 38 casos, Coari com 30, Manacapuru com 29, Humaitá com 23 e Tefé com 19 casos. Entre os casos registrados em Manaus, 133 são gestantes e há duas crianças com menos de 13 anos com AIDS e duas com HIV. Em Coari e Manacapuru, respectivamente 4 e 2 casos envolvem gestantes, assim como 2 em Parintins e 1 em Tefé. Ao todo, 170 gestantes vivem com HIV/Aids no estado.
Em relação à mortalidade por 100 mil habitantes, Uarini lidera com 20,6% (3 mortes), seguida de Itapiranga com 19,6% (2), Manaus com 7,3% (160 mortes) e Guajará com 6,9% (1).
Estratégias de prevenção e tratamento
Ana Galdina reforça a importância de educação em saúde, acessibilidade e acolhimento: “Precisamos falar sobre sexualidade, começando na escola, e levar informações claras sobre ISTs — não só HIV, mas sífilis, gonorreia, hepatite B. É fundamental que a população compreenda a mensagem e tenha acesso às ferramentas de prevenção. Não adianta educar se não houver acesso ou acolhimento adequado”.
Ela destaca que o tratamento evoluiu significativamente, tornando o HIV uma doença crônica controlável: “Hoje, o HIV é uma doença crônica, totalmente controlável, semelhante a diabetes ou hipertensão. O paciente toma um comprimido por dia, seguro e eficaz, desde que prescrito individualmente. A grande maioria dos casos de resistência está relacionada a não adesão. Quando bem seguido, o tratamento garante vida longa e qualidade de vida.”
Atualmente, a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição) medicamentos tenofovir e entricitabina pode ser usada diariamente ou, em alguns casos, de forma “sob demanda” antes de relações sexuais de risco, ajudando a prevenir a infecção pelo HIV.
Já a PEP (Profilaxia Pós-Exposição) deve ser iniciada em até 72 horas após uma possível exposição e tomada por 28 dias. Desde 2023, o cabotegravir injetável (Apretude) também passou a ser oferecido como alternativa de longo prazo para prevenção, disponível em serviços de saúde.
Ações e estratégias da FVS-AM
A FVS informa que a redução dos casos de HIV/Aids no Amazonas está relacionada ao fortalecimento das políticas de enfrentamento à doença, ao avanço das estratégias de prevenção combinada, como PrEP e PEP, à ampliação de serviços e à atuação de equipes de saúde que reforçam a conscientização sobre o agravo.
Informou também que a procura pela PrEP tem crescido, principalmente entre populações-chave, como homens que fazem sexo com homens, profissionais do sexo e pessoas trans, e que a testagem é gratuita e acessível a toda a população.
A Fundação citou que o acompanhamento de quem recebe o diagnóstico é realizado por equipes especializadas e que todos têm acesso a medicamentos antirretrovirais de forma igualitária, conforme os protocolos do SUS, com atenção especial a grupos vulneráveis, como gestantes, pessoas trans e indígenas. Em Manaus, a referência para dispensação e tratamento é a Fundação de Medicina Tropical – Heitor Vieira Dourado.
A FVS também explicou que, apesar da redução dos casos, a mortalidade ainda se mantém alta devido ao diagnóstico tardio, falta de cuidados regulares com a saúde sexual, comorbidades, coinfecções e, em alguns casos, abandono do tratamento.
Quanto às crianças e adolescentes, a Fundação informou que os casos em crianças estão geralmente ligados à transmissão vertical, enquanto adolescentes podem estar iniciando atividades sexuais precocemente, sem prevenção adequada. O acompanhamento inclui testagem rápida gratuita, orientação e cuidados especializados quando o diagnóstico é confirmado.
A instituição reforçou que suas estratégias incluem testagem, prevenção combinada, educação sexual e tratamento, alinhadas às metas internacionais e nacionais para eliminação da Aids até 2030, incluindo: diagnosticar 95% das pessoas vivendo com HIV/Aids, tratar 95% das diagnosticadas e garantir carga viral suprimida em 95% dos tratados, além de reduzir em 90% a incidência e os óbitos em relação a 2010.
“Qualquer pessoa pode fazer o teste rápido de HIV, independentemente de idade, gênero, orientação sexual ou qualquer outra condição. O teste é oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e também está disponível em algumas farmácias e outros locais. Acerca do acompanhamento, o mesmo é realizado com equipe especializada quando confirmado diagnóstico”, ressaltou.