
Por conta das comemorações pelos 200 anos da independência brasileira, Portugal cederá, em forma de empréstimo, uma relíquia que pouquíssimas pessoas puderam ver em quase dois séculos: o coração de Dom Pedro I — ou Dom Pedro IV, para os portugueses —, primeiro imperador do Brasil.
O órgão, que está guardado na Igreja de Nossa Senhora da Lapa, na cidade do Porto, desembarcará em Brasília na segunda-feira (22/8) numa cerimônia com honras de chefe de Estado.
O empréstimo do coração de Dom Pedro I ao Brasil foi possível depois de uma ampla negociação entre a embaixada brasileira em Lisboa, a Prefeitura do Porto e a Irmandade Nossa Senhora da Lapa, que detém o direito à propriedade da relíquia.
Havia muitas dúvidas se o transporte do órgão, realizado pela Força Aérea Brasileira (FAB), poderia acarretar danos, mas o Instituto de Medicina Legal do Porto (IML) avalizou a operação, apesar de todos os alertas.
O coração do monarca, que morreu em 1834, aos 35 anos, ficará no Brasil até 8 de setembro. Ao longo de três semanas, será exposto no Palácio do Planalto e no Itamaraty. Neste fim de semana, o coração foi, pela primeira vez, exibido ao público em Portugal.
A doação do coração de Dom Pedro I à Irmandade Nossa Senhora da Lapa foi prevista em testamento pelo imperador pouco antes de morrer. Era desejo dele que o órgão ficasse na cidade que o recebeu quando retornou a Portugal, em 1831, para recuperar o trono de sua filha, Dona Maria II, que havia sido roubado pelo tio dela, Dom Miguel. Em 1832, Dom Pedro I, que havia abdicado do reinado no Brasil, adentrou o Porto liderando um grupo de liberais que lutavam contra o então imperador absolutista.
Sem um exército suficiente, pois não teve o apoio esperado de França e Inglaterra, Dom Pedro I assinou uma aliança com os espanhóis para combater o irmão. Foram dois anos de guerra. Em 1834, ele conseguiu derrubar Dom Miguel e devolver o trono à filha, Dona Maria II. Portugal deixou de ser um reino absolutista para ser um reino liberal. O monarca, entretanto, já estava bastante fragilizado, havia contraído tuberculose. Morreu em setembro daquele ano.
Desde 1835, o coração do monarca está guardado a cinco chaves na Igreja de Nossa Senhora da Lapa, num monumento localizado na capela-mor, ao lado do Evangelho. A primeira chave abre uma placa de metal. A segunda e a terceira movimentam uma rede de ferro.
A quarta destranca uma urna e a quinta, uma caixa de madeira onde está depositada um porta-joias de prata que abriga o vidro que contém o órgão. O coração está conservado em uma substância de formol, que é trocada a cada 10 anos. A última foi em 2015. Seis pessoas participam do procedimento.


