Jornal publicou que procurador fez palestra remunerada para empresa citada pela Lava-Jato. Dallagnol, diz que suas palestras pelo Brasil são “legais e admitidas pela Constituição”

A manchete da Folha de S. Paulo desta quinta-feira, 25, traz a informação de que Dallagnol fez uma palestra remunerada no valor de R$ 33 mil e gravou um vídeo institucional para a empresa de tecnologia Neoway, citada em acordo de delação em caso de corrupção na força-tarefa da Lava Jato, mostram mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil analisadas em conjunto com o jornal.
Na ocasião, Dallagnol não sabia que a Neoway havia sido citada no âmbito da Lava Jato e manifestou preocupação sobre a palestra concedida à empresa.
A jornalista Vera Magalhães, colunista do jornal O Estado de S. Paulo, perguntou a Dallagnol, na entrevista da rádio, se, independentemente da questão legal envolvendo os pagamentos pela Neoway, é papel de um agente público se envolver financeiramente com empresas privadas.
Dallagnol respondeu que sua “missão” ao fazer as palestras é “educar a sociedade sobre a corrupção e promover a Operação Lava Jato na sociedade”.
O procurador também falou sobre a possibilidade de as primeiras mensagens vazadas pelo site The Intercept gerarem suspeição sobre a atuação do então juiz federal Sergio Moro no julgamento dos processos da Lava Jato.
De acordo com ele, um juiz só pode ser considerado suspeito se for amigo íntimo de uma das partes ou quando tiver interesse pessoal nos processos.
“Nunca fomos amigos, eu e o ministro Moro. Nunca frequentei sua casa nem ele a minha, nunca fomos a aniversários um do outro, não somos íntimos”, falou sobre a primeira hipótese, limitando-se a dizer que Moro julgou muitos processos sem conexão entre si para que fique provado interesse pessoal em algum deles.
A notícia
O procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, recebeu, em 2018, R$ 33 mil para fazer uma palestra para a empresa Neoway, que havia sido citada dois anos antes em um acordo de delação premiada. A informação, publicada nesta sexta-feira (26) pelo jornal Folha de S.Paulo , em parceria com o site The Intercept , faz parte de série de reportagens baseadas na troca de mensagens entre os procuradores da Lava-Jato no aplicativo Telegram.
Além de dar a palestra, em março de 2018, segundo a Folha, Dallagnol gravou um vídeo em que elogia o uso de ferramentas tecnológicas da empresa em investigações contra corrupção. No grupo de Whatsapp dos procuradores, ele chega a demonstrar a preocupação de que a gravação poderia ser entendida como se ele estivesse “vendendo o produto deles”. Ele afirma que essa não foi a intenção.
“Olhem que legal. Sexta vou dar palestra para a Neoway, do Jaime de Paula. Vejam a história dele: https://endeavor.org.br/empreendedores-endeavor/jaime-de-paula/. A neoway é empresa de soluções de big data que atende 500 grandes empresas, incluindo grandes bancos etc”, escreveu Dallagnol a um grupo de procuradores na época.
O procurador Júlio Noronha, também integrante da força-tarefa, respondeu pedindo que ele conseguisse marcar uma reunião com representantes da empresa para agregar soluções tecnológicas ao Laboratório de Investigação Anticorrupção (Lina). ““Exatamente. Isso em que estava no meu plano. Vou até citar ele na palestra pra ver se sensibilizo kkkk”, respondeu Dallagnol.
Quatro meses após a palestra, Deltan Dallagnol escreveu no chat que mantinha com outros procuradores que acabara de descobrir que a Neoway havia sido citada na delação do lobista Jorge Luz, que atuava para o MDB. No entanto, de acordo com o The Intercept Brasil, a empresa já havia aparecido em documentos oficiais em duas ocasiões: o rascunho da proposta de delação, em 2016, e em novos depoimentos de Luz, em 2017. Ambos foram enviados para o grupo de Telegram do qual o procurador fazia parte.
“Isso é um pepino pra mim. É uma brecha que pode ser usada para me atacar (e a LJ), porque dei palestra remunerada para a Neoway, que vende tecnologia para compliance e due diligence, jamais imaginando que poderia aparecer ou estaria em alguma delação sendo negociada”, afirmou o procurador na conversa.
Em sua delação premiada, em 2016, Luz afirma que atuou em favor da Neoway em um projeto de tecnologia da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras. O delator afirma que pagou o então deputado federal Cândido Vaccarezza e o atual deputado federal Vander Loubet (PT-MS) para aproximar as duas empresas entre 2011 e 2012. Neste caso, diz Luz, não houve pagamentos a funcionários da Petrobras.
Dallagnol responde à Folha
O procurador e coordenador da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, respondeu, nesta sexta-feira (26), as acusações de uma matéria publicada no jornal Folha de S. Paulo na manhã de hoje que, em parceria com o site The Intercept Brasil, disse ter encontrado indícios de que Deltan recebeu R$ 33 mil por essa palestra.
A respeito da matéria que a Folha publicou hoje, o procurador Deltan Dallagnol afirma ter atuado com absoluta correção. Ele não reconhece as mensagens que têm sido atribuídas aos integrantes da força-tarefa, que são fruto de crime e não tiveram contexto e veracidade confirmados.
Sem entrar no conteúdo das mensagens, é importante esclarecer o que ocorreu. Seguem documentos que explicam o ocorrido. É importante agregar informação sobre a linha do tempo: o procurador Deltan Dallagnol jamais participou de negociação ou ato de negociação do acordo de colaboração mencionado na reportagem, que era de responsabilidade da procuradoria-geral da República.
Ele não esteve entre os procuradores da força-tarefa designados para atuar no acordo. Assim que tomou conhecimento da menção da empresa Neoway no acordo, o procurador informou os colegas, em meados de 2018.
Após o acordo ser homologado pelo Supremo, o termo de depoimento do colaborador sobre a empresa foi enviado para a força-tarefa em Curitiba.
Assim que recebido, o procurador, no início de junho deste ano, declarou-se suspeito e o caso foi redistribuído para procurador de fora da força-tarefa.
Além disso, por questão de transparência e prestação de contas, o procurador encaminhou ofício ao corregedor do Ministério Público Federal explicando toda a situação. Isso ocorreu logo após o caso descer para Curitiba e antes da divulgação das supostas mensagens.
O corregedor, entendendo não haver nada de errado, arquivou o ofício.