A taxa de infecção é de 11,3% do efetivo da Força, o dobro da população brasileira em geral (4,8%) e maior que a dos trabalhadores da linha de frente da saúde contaminados pelo vírus (10,3%)
O reforço das Forças Armadas no combate ao coronavírus teve um preço alto para os militares. As missões aéreas, terrestres e fluviais pelo território brasileiro transportando vacinas, oxigênio, insumos e alimentos para as vítimas da pandemia, custaram a Força um número alto de baixas na luta contra a Covid-19 com índices de infectados que superam a taxa de trabalhadores das linhas de frente da saúde da população brasileira em geral.
O subtenente Lima Neto, morador de Manaus, foi contaminado pelo coronavírus em janeiro deste ano. O suboficial é um dos 40,9 mil militares ativos das Forças Armadas que foram diagnosticados com a doença, segundo dados do Ministério da Defesa enviados para o site Metrópole, que produziu uma reportagem ampla sobre a matéria, neste final de semana.
O número representa 11,3% do efetivo total (360 mil militares) da ativa das Forças Armadas – Marinha, Exército e Aeronáutica – contaminado pelo novo coronavírus. A taxa de infecção é maior do que a registrada entre profissionais da saúde e é o dobro do índice na população em geral.
Até a sexta-feira (26), foram confirmados 10,4 milhões de casos de Covid-19 no país, o equivalente 4,8% da população geral. Já a taxa de infecção entre os profissionais de saúde que estão na linha de frente é de 10,3%.
Segundo dados do Ministério da Saúde para a reportagem do site, cerca de 470,3 mil médicos, enfermeiros, cirurgiões, fisioterapeutas, dentre outros, contraíram a doença.
Em março do ano passado, o Ministério da Defesa publicou uma portaria normativa com instruções e restrições para evitar a disseminação do novo coronavírus. O texto prevê o cancelamento de viagens e missões, além da adoção do teletrabalho para servidores do grupo de risco ou que foram contaminados com a doença.
“Dentre as medidas estão: uso obrigatório de máscaras; distanciamento social recomendado de 1,5m; uso de álcool em gel 70%; limpeza de superfícies; manutenção de vidros, portas e janelas abertas, sempre que possível; realização de campanhas de conscientização dos militares; aferição de temperatura na entrada das Unidades; acompanhamento e tratamento médico dos casos suspeitos e confirmados; entre outras”, informou o Ministério da Defesa.
“O Brasil vivencia um manejo da pandemia no limite do desastroso, e não seria esperado que entre as Forças Armadas houvesse uma visão epidemiológica de alto risco”, complementa a portaria, destacando que o número de baixas entre os militares é considerada baixa.
Até o momento, 64 militares das Forças armadas morreram por causa da Covid-19, o que indica letalidade de 0,14% dos casos, bastante inferior ao índice da população geral, que é de 2,4%, segundo o Ministério da Saúde.
Entre as vítimas estão soldados, sargentos, tenentes, capitães, coronéis e um oficial-general – o general de brigada Carlos Augusto Fecury Sydrião Ferreira, morto em setembro do ano passado aos 53 anos.
Em nota, as Forças Armadas alegaram que, durante a pandemia, manteve o “pleno andamento das atividades” pois a defesa do país e a segurança das fronteiras marítima, terrestre e aérea, bem como o treinamento e o preparo, “são obviamente essenciais e não podem ser interrompidas”.
“Na realidade, a atual pandemia intensificou ainda mais as ações da Marinha, do Exército e da Força Aérea. A Operação Covid-19, de combate à pandemia, envolveu diariamente mais de 34 mil militares trabalhando em todo o território nacional”, ressalta o documento.
O ministério também informa que militares com suspeita de exposição ao novo coronavírus ou qualquer sinals da doença, por mais leves que sejam, são direcionadas ao isolamento e recebem o tratamento adequado.
Entre os contaminados, o subtenente de Engenharia do Exército Brasileiro (EB) Daniel dos Santos Melo, de 50 anos, contraiu a doença enquanto trabalhava na Operação Acolhida, em uma obra de expansão de um novo abrigo para refugiados venezuelanos, em Paracaima (RR).
Os sintomas começaram em 9 de fevereiro. Inicialmente, o militar acreditou ser pressão alta, uma vez que é hipertenso, mas logo notou que era Covid-19, pois não sentiu o gosto do açaí que tomara.
“Comecei a sentir falta de apetite, cansaço, um pouco de febre, diarreia e vômitos. Foi quando decidi procurar o serviço médico, e imediatamente veio a ordem de evacuação de ambulância de Pacaraima para Boa Vista”, relembra Daniel.
Em Boa Vista, ele foi internado em um hospital de campanha, com saturação de 79%. Após a confirmação do diagnóstico, foi preciso fazer uma segunda viagem. O militar foi transferido de avião para Belém (PA), onde seguiu internado até sexta-feira (26).
“Foram dias em que estive atrelado ao oxigênio e a aparelhos de acompanhamento dos sinais. Mas sempre com medo, pois vi vários ‘velhinhos’ passando por diversas dificuldades durante o tratamento. Isso me abalou um pouco o psicológico”, relata o subtenente.
“Eu sou novo, toda medicação que me aplicavam surtia os efeitos desejados. Mas com os idosos, os médicos tinham de montar um verdadeiro quebra-cabeças para tratar. O que a gente vê e se assusta nos noticiários do Brasil e do mundo, eu presenciei pessoalmente. Muito triste”, complementa.