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Após tumultuada sessão, CCJ aprova parecer a favor da reforma da Previdência

Para aprovação, governo teve de ceder as exigencias do ‘bloco parlamentar’ que passou a aprovar o texto assumindo o protagonismo na tramitação.

Depois de uma sessão que durou mais de 9 horas, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou nesta terça-feira (23) a proposta de reforma da Previdência elaborada pelo governo e encaminhada ao Congresso em fevereiro.

48 deputados votaram a favor do texto e 18 foram contrários à proposta. A sessão foi marcada por tumultos e tentativas da oposição de adiar novamente a discussão do texto.

O governo aceitou abrir mão de quatro pontos na proposta, mas afirma que as alterações não impactam na economia de R$ 1 trilhão estimada pelo governo. Agora, o texto será enviado para a comissão especial para análise do conteúdo da proposta.

A oposição quer recorrer à Justiça para tentar anular a votação da CCJ. A líder da minoria na Câmara, Jandira Feghali (PCdoB-RJ), afirmou que os partidos de oposição vão entrar com um mandado de segurança para sustar a sessão. “A batalha continua. Esse foi o primeiro ciclo”, disse Jandira. “

À votação da proposta pela CCJ ressalta as dificuldades na tramitação do texto mostram que o governo deve melhorar a articulação com os deputados para facilitar a análise pela comissão especial. A oposição tentou adiar a votação com uma série de questões de ordem que incluíam reclamações sobre erros de português no texto da proposta.

Em alguns momentos, o presidente da CCJ, deputado Felipe Francischini (PSL-PR), precisou interromper a sessão para pedir ordem aos deputados. “Não vou aceitar que fiquem gritando. Isso aqui não é feira”, disse em um dos momentos de tumulto. A sessão da CCJ teve início às 15h e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acompanhou as discussões a partir do fim da tarde.

Após a aprovação do texto, Maia reafirmou a importância da reforma e enfatizou que o momento agora é de o governo se engajar na articulação.

Negociações entre gigantes – Bloco parlamentar obtém tudo o que exigia para apoiar a aprovação do texto na CCJ e assume o protagonismo na tramitação da reforma na Câmara

A desarticulação política do governo tornou o Centrão – bloco de partidos integrado por DEM, PR, PRB, PP e Solidariedade – protagonista na reforma da Previdência. O bloco foi o principal vitorioso na aprovação do parecer favorável à reforma no final da noite de ontem na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ), por 48 votos a 18.

Para obter apoio do bloco, o governo aceitou alterar quatro pontos do texto original (leia mais  aqui). Além disso, de acordo com relatos dos próprios parlamentares publicados na imprensa, o governo ofereceu um aumento no valor das emendas orçamentárias destinadas a cada deputado que votasse pela reforma na CCJ.

De R$ 15 milhões por ano, as emendas previstas no Orçamento passariam a R$ 25 milhões até 2022, resultando num incremento de R$ 40 milhões para cada deputado. Caso seja aprovada a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Orçamento Impositivo, a maior parte desse valor teria execução obrigatória. Seria dinheiro controlado pelos parlamentares, destinado a projetos em suas bases – a velha política do “toma lá, dá cá” contra a qual Bolsonaro pregava na campanha eleitoral.

O Centrão sai da votação de ontem também como favorito a controlar os dois principais cargos na Comissão Especial da reforma que deverá ser estabelecida amanhã na Câmara: a presidência e a relatoria. O projeto original do governo continuará a ser desfigurado para garantir os votos do bloco – e as economias de R$ 1,1 trilhão almejadas e proclamadas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, podem desde já ser consideradas um delírio.

Entre as principais alterações já cogitadas estão a exclusão do texto das mudanças no abono salarial, nas aposentadorias rurais e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), concedido a deficientes ou a idosos que não consigam comprovar tempo de contribuição. De acordo com os números do último relatório da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, esses três itens somam economias de R$ 228,5 bilhões em dez anos. O máximo que a reforma poderia poupar aos cofres públicos cairia, portanto, a R$ 844 bilhões em uma década.

As alterações propostas por parlamentares do Centrão não ficariam por aí. Entrou em discussão também a suspensão da obrigatoriedade das mudanças nas previdências de Estados e municípios, que economizariam mais de R$ 500 bilhões no período (o trilhão proclamado por Guedes se refere apenas às economias para o governo federal).

Deputados ligados ao Centrão falam ainda em retirar do texto a criação do regime de capitalização, em mexer nos critérios para aposentadorias dos professores e em manter as regras para aposentadoria como matéria constitucional, dificultando mudanças futuras.

Nenhuma dessas mudanças precisará da oposição para ocorrer. Elas representam apenas uma espécie de custo mínimo que o governo deverá pagar para que a reforma prossiga em sua tramitação e obtenha os votos de 308 deputados e 49 senadores em dois turnos, necessários à aprovação de qualquer emenda à Constituição.

A estratégia dos oposicionistas para barrar a reforma pôde ser vislumbrada na sessão de quase nove horas ontem na CCJ: tentar obstruir os trabalhos de todas as formas possíveis, usando quando necessário os argumentos mais estapafúrdios. Vale tudo, no limite até bate-boca e gritaria.

Tal atitude retira da oposição a credibilidade necessária para se fazer ouvir quando tem razão. Era o caso do pedido para que a CCJ aguardasse a divulgação pelo governo dos estudos que embasaram os cálculos das economias da reforma, esperados para amanhã.

Não era sensato a CCJ ter votado a constitucionalidade sem conhecer tais números, já que avaliar o impacto orçamentário é parte das exigências constitucionais sobre qualquer emenda – e, por definição, não existe reforma da Previdência sem impacto orçamentário.

Apesar disso, o presidente da CCJ, deputado Felipe Francischini, preferiu levar a cabo uma sessão tensa e exaustiva, com a apreciação (e rejeição) de nada menos que sete requerimentos pedindo adiamento da votação do parecer sobre a reforma, a arriscar deixar para outro dia e perder os votos já comprometidos. Ao todo, o texto levou 62 dias para superar a fase da CCJ (foram apenas 10 para o projeto enviado no governo Temer, que contava com uma base parlamentar estável).

Também é correto discutir o impacto da reforma sobre os diferentes estratos sociais, como quer a oposição. Mas é um absurdo que deputados preparados insistam que a reforma necessariamente prejudica os pobres, apenas porque o custo total é maior para os aposentados pelo INSS (R$ 671 bilhões em dez anos, segundo a IFI).

Em 2017, os 723 mil aposentados e pensionistas do governo federal ganhavam em média R$ 9.179 por mês, enquanto os 34,4 milhões de beneficiários do INSS recebiam R$ 1.200. No total, é evidente que o governo gastou mais com os mais de 34 milhões que ganham menos (R$ 557 bilhões, ante R$ 82 bilhões) – mas isso não reduz em um centavo o privilégio dos 723 mil.

O correto, portanto, é estimar o custo individual médio para cada beneficiário, de acordo com sua faixa de renda, para só então comparar as perdas dos mais pobres com as do alto funcionalismo público, pertencente à classe alta. Os números que o governo divulgará amanhã permitirão fazer esse cálculo, além de outras simulações. Contribuirão para dirimir enfim a questão e demonstrarão quem, na verdade, a oposição defende ao tentar barrar a reforma da Previdência: os pobres ou os privilégios do funcionalismo.

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