O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) concedeu habeas corpus ao médico Mouhamad Moustafa, condenado pela Justiça amazonense há 15 anos de prisão, em 2018, por desvio de dinheiro da saúde do Amazonas na operação Maus Caminhos.
Ele havia deixado o complexo penitenciário do km 8 da BR-174 (Manaus-Boa Vista), em agosto do ano passado, após ter a prisão convertida para o regime semiaberto e usar a tornozeleira eletrônica.
O médico foi preso durante a operação da Polícia Federal, que aconteceu em 2016, e apontou o desvio de mais de R$ 100 milhões na Saúde do estado.
Conforme o advogado de defesa, Fabricio Parente, Mouhamad está aguardando os trâmites da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) para retirada da tornozeleira eletrônica, prevista para esta terça-feira (10).
O pedido de habeas corpus foi aceito pela desembargadora do TRF1, Mônica Sifuentes, no dia 3 deste mês. De acordo com Parente, o acórdão só foi assinado pela desembargadora na sexta-feira (6), e, então, encaminhado à 4ª Vara do TRT e Seap.
No acórdão, a relatora afirma que a manutenção de medidas cautelares referentes à prisão de Mouhamad se mostra desnecessária. Ela justifica que ele cumpriu prisão preventiva por mais de quatro anos e está em liberdade há mais de um ano, “sem que tenha dado causa a qualquer conduta capaz de pôr em risco a ordem pública ou econômica; a aplicação da lei penal; ou a instrução criminal; quando já sentenciada a ação penal subjacente”.
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O nome “Maus Caminhos” é uma referência ao nome da entidade Instituto Novos Caminhos (INC), utilizada pelo grupo criminoso para viabilizar a maior parte dos desvios e fraudes envolvendo recursos da pasta de saúde no Estado do Amazonas. Assim como ocorreu com a Operação Lava Jato, embora a investigação tenha ganhado diferentes nomes a cada nova fase, o nome inicial se consagrou.
A Operação Maus Caminhos é a investigação de corrupção com maior volume de recursos públicos, agentes públicos da alta cúpula envolvidos e número de fases de desdobramentos já conduzida pelos órgãos de fiscalização e controle no Amazonas.
O valor preciso dos desvios praticados pela organização criminosa ainda não foi definido, devido ao fato de que há frentes da investigação ainda em aberto, mas estima-se que ultrapasse a casa dos R$ 100 milhões.
Os fatos que deram origem à investigação policial foram apurados a partir de provocação do Ministério Público Federal (MPF) que, após responsabilizar na Justiça o ex-secretário de Estado da Saúde Wilson Duarte Alecrim, servidores e a direção do Hospital Santa Júlia Ltda. também por irregularidades em contratos na saúde pública estadual, pediu à Controladoria-Geral da União (CGU) apurações mais amplas sobre a aplicação de recursos pela Secretaria de Estado da Saúde do Amazonas (Susam).
O começo do caso – A primeira fase da operação, deflagrada em setembro em 2016, identificou e prendeu os líderes e principais agentes do grupo que desviou milhões em recursos públicos destinados à pasta de saúde no Amazonas, por meio de contratos firmados com o governo do Estado para a gestão de três unidades de saúde em Manaus, Rio Preto da Eva e Tabatinga, feita pelo INC, instituição qualificada como organização social.
A organização criminosa identificada, nesse primeiro momento, tinha como líder principal Mouhamad Moustafa. Ele contava ainda com a atuação de uma gerente para os negócios escusos de suas empreitadas e de outros funcionários de suas empresas que exerciam importantes funções administrativas no esquema, além de um grupo de quatro empresas por meio das quais conseguia reverter parte do dinheiro desviado por meio de contratos superfaturados de volta para si.
Nesse esquema, quebras de sigilo fiscal e bancário revelaram que, dos quase R$ 900 milhões repassados, entre 2014 e 2015, pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS) ao Fundo Estadual de Saúde (FES), mais de R$ 250 milhões teriam sido destinados ao INC.
A apuração da primeira fase indicou a prática de desvios milionários por meio de pagamentos a fornecedores sem contraprestação ou por serviços e produtos superfaturados, movimentação de grande volume de recursos via saques em espécie e lavagem de dinheiro pelos líderes da organização criminosa.
Uma das fraudes identificadas ocorreu no processo de aquisição do sistema de gestão hospitalar, oportunidade em que o INC pagou a uma das empresas do grupo criminoso o valor de mais de R$ 1 milhão por um serviço que poderia ser adquirido pelo Estado pelo valor real de cerca de R$ 318 mil – valor cobrado pela empresa desenvolvedora do sistema, o que representa um superfaturamento de quase 400%.
Além disso, a organização criminosa contava com um braço armado, composto por policiais civis e militares, que trabalhavam de forma irregular a serviço da cúpula, exercendo os mais variados papéis, desde simples seguranças e vigias, até o de torturadores e cobradores de dívidas.
O coronel da Polícia Militar Aroldo Ribeiro, ex-comandante da corporação no Amazonas, era o chefe do braço armado e recebia R$ 10 mil mensais por serviços de segurança privada, efetivados ilegalmente por ele mesmo e por outros policiais civis e militares de sua confiança.