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Origem da fumaça que encobriu Manaus por meses são de queimadas da BR-319 e AM-254

Especificamente nos municípios de Manaquiri, Careiro e Autazes – diz estudo.

A origem da fumaça que encobriu Manaus por meses em 2023 está diretamente ligada ao aumento do desmatamento ao longo das rodovias BR-319 e AM-254, especificamente nos municípios de Manaquiri, Careiro e Autazes.

A constatação é de pesquisa publicada na revista Discover Sustainability por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), da  Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

Para verificar a relação entre a exploração de terras nas rodovias e a poluição na capital amazonense, a equipe utilizou dados atmosféricos do Observatório Amazon Tall Tower (ATTO), do Inpa, situado cerca de 150 km a nordeste de Manaus, na direção do Pará, e de sensores da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) para verificar as emissões de material particulado PM2.5, indicador-chave de poluição atmosférica; dados do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET); e dados de satélite do Projeto de Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Em 12 de outubro de 2023, quando Manaus amanheceu encoberta por fumaça, a concentração de PM2.5 chegou a 314,99 µg/m³, valor 20 vezes superior ao limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde, de 15 µg/m³.

Queimadas e incêndios florestais

Conforme a pesquisa, os incêndios foram agravados por uma seca extrema na Amazônia, resultante da combinação do El Niño e do chamado dipolo do Atlântico – quando as águas da porção norte do oceano ficam mais quentes, o que reduz a umidade que chega à Amazônia.

Tais fenômenos criam condições propícias para incêndios florestais criminosos, que liberam grande quantidade de partículas de fumaça na atmosfera. A poluição intensifica a seca ao inibir a formação de chuva.

Sobre a origem da fumaça, Philip Fearnside, pesquisador do Inpa e coautor do estudo, explica: “É descartado que a fumaça tenha vindo do Pará porque mensuramos tanto as emissões do

estado quanto as do meio do caminho e elas não tinham a mesma proporção do nível de fumaça que chegou a Manaus”. A estação ATTO mostrou índices diários de qualidade do ar mais baixos em comparação com a média das estações localizadas ao sul de Manaus.

Já os sensores da UEA em Santarém (PA) registraram picos após os verificados na capital amazonense — e com níveis inferiores. Além disso, mapas de vento e dados meteorológicos para outubro e novembro de 2023 indicaram uma grande pluma de fumaça originada da região sul de Manaus, claramente separada das emissões no Pará.

Segundo Lucas Ferrante, pesquisador da USP e principal autor do trabalho, observações de campo mostraram áreas queimadas nos municípios de Careiro e Autazes e no trajeto da BR-319, sendo rapidamente convertidas em pastagens, com presença de maquinário e gado.

Diante dos resultados, os pesquisadores enfatizam que a proposta de reconstrução da BR-319 é inviável e, aliada à fraca fiscalização ambiental, ameaça não apenas a biodiversidade e a estabilidade climática, mas também a sustentabilidade de centros urbanos que dependem da integridade ecológica da Amazônia.

A estrada, que liga Manaus a Porto Velho, pode impactar 63 terras indígenas, cinco comunidades não reconhecidas e uma população de indígenas isolados, totalizando mais de 18 mil indígenas afetados pela rodovia.

O governo federal afirmou que deve anunciar um “acordo definitivo” em setembro para a pavimentação da rodovia.

Porém, avalia Ferrante, “a BR-319 é uma fórmula para o desastre e servirá como espinha dorsal para aumento de incêndios e desmatamentos ilegais em área de floresta intacta, além de abrir áreas com reservatórios zoonóticos, com potencial de liberar novos patógenos preocupantes para a saúde global”.

Segundo o estudo, as soluções passam por priorizar alternativas de baixo impacto, como a melhoria das vias navegáveis, e por políticas integradas que vão além da prevenção reativa de incêndios, confrontando a expansão ilegal da pecuária, grilagem de terras e falta de fiscalização, que alimentam continuamente a degradação ambiental na Amazônia.

Confira o estudo aqui.

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