Mercado reagiu negativamente à medida que deve furar o teto de gastos; crédito extra deve ser permanente

Sem perspectiva de aumento de arrecadação, os gastos extras na casa de R$ 175 bilhões com a PEC da Transição, que virou ‘Fura-Teto’, deve causar aumento da dívida pública.
As últimas declarações de Lula sobre economia e ainda sem uma definição do próximo ministro responsável pela área tem deixado um clima de insegurança no país, além dos gastos fora do orçamento.
Sem isso, o país pode assistir à inflação subir e à taxa Selic ser ajustada para cima em busca de controle, acarretando juros mais altos.
A reação negativa do mercado à medida, que deve furar a regra do teto de gastos, foi sentida logo após o último discurso de Lula.
A apreensão se dá pela possibilidade de aumento da dívida pública. Com isso, o movimento natural seria a cobrança de juros mais altos, fazendo com que o Executivo precise destinar uma parte maior da arrecadação futura para honrar com o pagamento de dívidas.
“Assim, deixa-se menos para despesas discricionárias. Esse impacto só será minimizado se o país crescer mais que os 2,5% estimados no PLOA (Proposta da Lei Orçamentária Anual), o que me parece bastante improvável”, avalia Rafael Miranda, mestre em economia pela FGV.
Um cenário possível a partir do próximo ano levando em conta as projeções de recessão, segundo Miranda, é que as famílias mais vulneráveis aumentem o poder de consumo.
No entanto, sem uma produção compatível, os preços dos produtos sobem, acarretando em aumento da inflação.
O movimento do Banco Central pode ser, então, o de elevar a taxa Selic, subindo as taxas de juros e dificultando empréstimos e financiamentos.
Medida permanente
O governo eleito defende que se extrapole o teto de gastos. Antes de deixar Brasília após se reunir com a equipe de transição, Lula criticou a reação negativa ao discurso e disse nunca ter visto “um mercado tão sensível”.
Já o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), disse apostar em um crescimento econômico. “O que precisa é a economia crescer.
Esse é o fator relevante. E aí é importante o investimento, público e privado, recuperar planejamento no Brasil e bons planejamentos.”
Outro fator que leva à desconfiança do mercado sobre a PEC é que o excedente de gastos pode se tornar uma constante. O relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI), já afirmou que as mudanças previstas no teto de gastos para bancar os auxílios seriam permanentes.
“A ideia é que haja um compromisso da sociedade brasileira com os mais carentes, com os mais pobres. E que eles possam sentir que há uma segurança de que estará excepcionalizado para sempre esse recurso”, disse, na quinta-feira (10).
O teto de gastos entrou em vigor em 2016 e é a principal regra fiscal que limita o crescimento das despesas em relação à inflação. Na prática, a ideia é congelar os gastos públicos para que o aumento em despesas siga a inflação.
Atual secretário da Fazenda e Planejamento de São Paulo, e cotado para assumir o Tesouro Nacional no governo Lula, Felipe Salto acredita que o governo de transição “precisa fazer um aprimoramento das regras fiscais para evitar constrangimento de todo ano ter que aumentar o teto de gastos, que mobiliza recursos, políticas, esforço do governo e tempo”.
Ele defende a necessidade de mudar o teto de gastos para um limite de despesa, a fim de manter regras de controle, mas sem precisar ferir as normas ano após ano.
Além disso, Salto defende uma reforma tributária. “Principalmente o ICMS, que produz uma série de distorções e complexidade no regimento tributário que já são muito conhecidas e poderiam ser resolvidas.
É necessário uma reforma estrutural, discutir a questão das vinculações, do peso das despesas obrigatórias do orçamento.”