
Dois ex-assessores do deputado André Janones (Avante-MG) relatam que o parlamentar cobrava funcionários lotados em seu gabinete na Câmara a repassar parte dos seus salários, do 13º e até 60% dos vencimentos.
Em entrevista ao jornal O Globo, os servidores Cefas Luiz Paulino e Fabrício Ferreira de Oliveira disseram que a prática, conhecida como “rachadinha”, envolvia até mesmo os valores em dinheiro e mais da metade dos seus salários de assessores.
A suspeita de rachadinha no gabinete de Janones é investigada pela Polícia Federal desde 2021. Em áudios divulgados na última segunda-feira (27) pelo site Metrópoles, o deputado diz que os servidores deveriam usar uma fatia dos salários recebidos da Câmara para pagar dívidas de campanha.
O parlamentar nega ter praticado qualquer irregularidade e afirmou nas redes sociais que o pedido revelado na gravação foi feito ainda antes de se eleger, em 2018, para pessoas que ainda não trabalhavam em sua equipe.
Janones disse ainda que não colocou a sugestão em prática, já que a ideia foi “vetada” por sua advogada. Procurado pela reportagem para falar sobre a acusação dos ex-funcionários, ele não retornou aos contatos.
De acordo com Paulino, que trabalhou no gabinete de fevereiro de 2019 até outubro de 2022, com salário de R$ 19.562, os pedidos para repassar parte do seu salário começaram no início de 2019, logo após Janones assumir o seu primeiro mandato. O parlamentar foi reeleito no ano passado.
Segundo o ex-funcionário, a responsável pela arrecadação dos recursos juntos aos assessores de Janones era Leandra Guedes (Avante), atual prefeita de Ituiutaba, em Minas Gerais, e aliada de confiança do parlamentar. Ela foi procurada pelo jornal carioca por meio de sua assessoria, mas não se manifestou.
— O primeiro pedido ocorreu em 5 de fevereiro de 2019, assim que ele se elegeu pela primeira vez. Depois disso, todos passaram a repassar um percentual de seus salários em dinheiro vivo, ninguém fazia transferência bancária para a Leandra. Quem ganhava menos também doava, era uma contribuição proporcional, inclusive em cima do 13º salário de cada um — afirmou Paulino.
Ainda de acordo com o ex-funcionário, Janones passou a pedir aos servidores que pagassem despesas pessoais do deputado, em vez de enviar parte do salário diretamente a ele. Paulino, no entanto, diz que não chegou a repassar os valores.
— No final de 2021, passamos a pagar do próprio bolso, despesas como a hospedagem do site e alimentação do deputado. O objetivo era não caracterizar o repasse, de forma tão aberta. Era a Leandra quem fazia a contabilidade dos gastos que cada um deveria ter e coordenava os saques feitos na primeira fase da rachadinha — disse o ex-assessor.
Lotado no gabinete de Janones entre fevereiro de 2019 e dezembro de 2021, Oliveira diz que, além das despesas, os servidores eram obrigados a fazer doações ao Avante, partido do qual Janones faz parte. O ex-assessor contou ter começado a trabalhar com o deputado ainda em 2018, de forma voluntária, e ter passado a integrar o seu gabinete em 2019, após a eleição. Ele deixou o gabinete do parlamentar em dezembro de 2021, com um salário de R$ 9.460.
— De início, Janones tratava o assunto com muitos cuidados, ele colocava panos quentes para não caracterizar rachadinha. Eu estava entrando na vida pública, não conhecia o crime de peculato, não sabia o que era uma rachadinha e as implicações da sua ilegalidade. Os repasses dos valores recebidos chegaram a 60% dos totais dos salários, inclusive do 13º. Janones e a Leandra chegaram a obrigar funcionários a fazer contribuiçõies mensais ao Avante, com parte dos seus salários. O pedido, na primeira fase do esquema, era para que o dinheiro sacado em espécie fosse repassado na casa de outros funcionários, em uma ou duas parcelas — afirmou.
Procurado pela reportagem para comentar as declarações do ex-assessores, o deputado Janones não se pronunciou.