“Tenho uma obsessão: provar a farsa montada aqui dentro e nos EUA contra mim”, diz Lula .

Condenado em várias instâncias da justiça brasileira e atualmente tendo como endereço uma cela da Polícia Federal em Curitiba, o ex-presidente Lula deu entrevista nesta sexta-feira (26) aos jornais Folha de São Paulo e El Pais. Mais uma vez ele repetiu o surrado discurso de que é inocente e vítima de uma perseguição, uma farsa internacional – os EUA também fariam parte dessa trama. A reportagem foi concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), atendendo a um pedido dos dois veículos de comunicação.
Em um trecho da conversa, Lula diz querer sair da cadeia “com a cabeça erguida” e disse que o país está sendo governado por “um bando de maluco”. Em outros momentos alega inocência: “Como eu entrei, inocente.” Em outro volta a atacar chamando o juiz federal Sérgio Moro, atual Ministro da Justiça e Segurança Pública, e o procurador Deltan Dallagnol de mentirosos.
“Eu tenho certeza, o Moro tem certeza… se as pessoas não confessarem agora, no dia da extrema unção a gente vai confessar. Ele [Moro] tem certeza que eu sou inocente. Esse Dallagnol tem certeza, que ele é mentiroso e mentiu ao meu respeito.”
Sobre o apartamento triplex no Guarujá (SP) que motivou a prisão, Lula disse que “Moro mentiu” ao atribuir-lhe a propriedade do imóvel.
Lula disse acreditar que o STF (Supremo Tribunal Federal) vai inocentá-lo, porque a Corte muitas vezes já contrariou pressões populares em votações.
“A única coisa que eu quero é que votem com relação aos autos do processo. Eu não peço favor a ninguém, eu não quero favor de ninguém. Eu só quero que julguem em função das provas.”

A entrevista foi realizada em uma sala da Polícia Federal onde os jornalistas foram orientados a manter uma distância de 4 metros do condenado, sentado em uma mesa. Ninguém poderia se aproximar. Segundo a PF, eles estavam cumprindo um protocolo de segurança comum a todos os presos.
Em duas horas e dez minutos de conversa, o Lula falou da vida na prisão, da morte do neto, do governo de Jair Bolsonaro, das acusações de corrupção que sofre e da possibilidade de nunca mais sair da prisão. “Não tem problema”, afirmou ele quando questionado sobre a possibilidade. “Eu tenho certeza de que durmo todo dia com a minha consciência tranquila. E tenho certeza de que o Dallagnol não dorme, que o ministro da Justiça e ex-juiz Sergio Moro não dorme.” Reservou ao ex-magistrado, o primeiro que o condenou pelo caso do triplex do Guarujá, algumas de suas principais ironias. “Sempre riram de mim porque eu falava ‘menas’. Agora, o Moro falar ‘conje’ é uma vergonha”, afirmou.
Lula disse também acreditar que “Moro não sobrevive na política”. Já sobre o presidente Jair Bolsonaro, não foi tão taxativo. Apesar de várias críticas, afirmou que “ou ele constrói um partido sólido, ou não perdura”. Lula disse que a elite brasileira deveria fazer uma autocrítica depois da eleição de Bolsonaro. “Vamos fazer uma autocrítica geral nesse país. O que não pode é esse país estar governado por esse bando de maluco que governa o país. O país não merece isso e sobretudo o povo não merece isso”, afirma. E comparou o tratamento que a imprensa dá a ele com o que reserva ao atual presidente da República. “Imagine se os milicianos do Bolsonaro fossem amigos da minha família?”, questionou, referindo-se ao fato de o filho do presidente, Flávio Bolsonaro, ter empregado familiares de um miliciano foragido da Justiça em seu gabinete quando era deputado estadual pelo Rio. O ex-presidente chorou quando falou da morte do neto Artur, de 7 anos, vítima de uma bactéria, há um mês: “Eu às vezes penso que seria tão mais fácil que eu tivesse morrido. Eu já vivi 73 anos, poderia morrer e deixar o meu neto viver”.
Lula disse ainda que, se sair da prisão, quer “conversar com os militares” para entender “por que esse ódio ao PT” já que seu governo teria recuperado o orçamento das Forças Armadas. Disse que acompanha a briga de Bolsonaro com o vice-presidente, Hamilton Mourão. Mas afirmou que era “grato” ao general “pelo que ele fez na morte do meu neto [defender que ele fosse ao velório], ao contrário do filho do Bolsonaro [Eduardo]”, que afirmou no Twitter que Lula queria se vitimar com a morte do menino. Afirmou que o país tem hoje “o mais baixo nível de política externa que já vi na vida”. E disse, em tom de brincadeira, que o ex-chanceler de seu governo, Celso Amorim, tem uma dívida por ter deixado o atual chanceler, Ernesto Araújo, seguir carreira no Itamaraty.
Questionado sobre Fernando Henrique Cardoso, disse que o ex-presidente poderia “ter um papel de grandeza e mais respeitoso com ele mesmo, não comigo”.
O ex-presidente falou ainda da necessidade de diálogo entre partidos de esquerda. E comentou o fato de o senador Cid Gomes (PSB-CE), irmão de Ciro Gomes, que afirmou em um encontro do PT: “Lula está preso, babaca!”. O petista disse que não ficou chateado pois está mesmo preso. “Isso é uma verdade. Só não precisava chamar os outros de babaca”, disse, rindo. Lula foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá. Ele está preso desde abril de 2018, depois de ter sido condenado pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), a segunda instância da Justiça Federal.
Na última terça-feira (23), em decisão unânime, a Quinta Turma do STJ reduziu a pena do ex-presidente e abriu caminho para ele saia do regime fechado ainda neste ano. O tribunal manteve a condenação do petista, mas baixou a pena de 12 anos e 1 mês de prisão para 8 anos, 10 meses e 20 dias. O petista já foi condenado também no caso do sítio de Atibaia (SP) -a 12 anos e 11 meses pela juíza Gabriela Hardt, na primeira instância em Curitiba, pelos crimes de lavagem de dinheiro e corrupção. O caso, porém, ainda passará pela análise do TRF-4.
‘Lula pertence ao meu passado’, diz Moro ao comentar redução de pena de Lula

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, afirmou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pertence ao “passado” dele e que hoje ele “olha para a frente”. A fala surgiu após um encontro realizado com empresários, autoridades mineiras e universitários no bairro Funcionários, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, nesta sexta-feira (26). Moro veio à capital para conversar com lideranças do setores público e privado a respeito de propostas do Governo Federal, entre elas o pacote anticrime.
Depois do encontro, Moro reuniu-se com jornalistas em uma coletiva de imprensa no mesmo local. Inevitavelmente, ele foi questionado a respeito da decisão dos ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que reduziu a pena do petista de 12 anos e um mês de prisão para 8 anos e 10 meses, no caso do triplex do Guarujá (SP).
Ao responder, o ministro foi enfático e defendeu a “autonomia da corte”. “Olha, o presidente Lula pertence ao meu passado. Hoje olho pra frente. A corte tem autonomia para definir a dosimetria e isso é algo que diverge entre muitos. Se você reunir 10 juízes em uma sala, cada um terá uma pena diferente”, disse.
Moro ainda falou que o que ocorreu no caso de Lula é frequente em outros e que não cabe a ele emitir “opinião no processo envolvendo o ex-presidente”.
Sobre o relacionamento entre o presidente Jair Bolsonaro e o vice Hamilton Mourão (PRTB), Sergio Moro disse, mais uma vez, que não lhe cabe opinar. “Não me envolve, isso é um episódio superdimensionado. É uma questão que envolve os o presidente e o vice”, afirmou.