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Com 84 anos de atividades, Aeroclube em Manaus está ameaçado de fechar

No local funciona a única escola de formação de pilotos e comissários de voo da região Norte

Mudança do Aeroclube de Manaus é tema de audiência na Aleam

Em 23 de novembro de 2023, o Aeroclube do Amazonas, localizado no bairro de Flores, em Laranjeiras, na zona Centro-Oeste de Manaus, perdeu para a Infraero a sua administração. Com a decisão do Ministério de Portos e Aeroportos, cerca de 30 funcionários, ameaçados de perder seus empregos, foram realocados do Aeroporto Internacional de Manaus Eduardo Gomes, cuja gestão foi entregue à iniciativa privada, especificamente ao grupo Vinci Airport. Eles passaram a operar no aeroporto de Flores.

Desde então, conforme relatado pelos associados do Aeroclube, a Infraero tomou posse do local sem oferecer qualquer tipo de compensação, incluindo a desapropriação de aproximadamente 15 hangares para aviões e helicópteros, dois prédios administrativos (um deles abrigando a escola de aviação, a única da região Norte) e a área de embarque e desembarque.

Francimar Sampaio, tesoureiro do Aeroclube do Amazonas e engenheiro civil, conta que a sobrevivência do ACA dependia das mensalidades dos alunos dos cursos de aviação (piloto e comissários) e dos aluguéis dos hangares, “tomados à força” pela Infraero.

Conforme Francimar, todos os hangares e imóveis do Aeroclube foram construídos por conta própria ao longo de seus 84 anos de existência, incluindo a manutenção da pista de pouso e decolagem.

No entanto, por meio de uma emissão de posse concedida por um juiz da Vara Federal, a Infraero assumiu o patrimônio e tem agido para “asfixiar o ACA”.

“Simplesmente ignoraram que há um processo judicial em andamento, movido pelo Aeroclube, questionando a validade da matrícula da União, pois não segue a Lei de Registros Públicos e ignora três títulos definitivos registrados desde 1940. A matrícula da União, de 1976, já indicava a inexistência de áreas particulares registradas aqui, tornando-a nula”, argumenta o tesoureiro.

Apesar disso, Francimar aponta que a Infraero, com base em uma portaria do Ministério de Portos e Aeroportos, está dificultando o funcionamento da escola de aviação, enquanto o Brasil carece de mais pilotos e a única escola da região Norte está ameaçada.

“Eles licitaram o serviço de estacionamento, que não era cobrado por nós, e já anunciam novas licitações para hangares, hoje ocupados por empresas com contratos antigos. Quem não aceitar os novos contratos será despejado”, conta o tesoureiro.

O maior desgosto, porém, é que a nova administração encaminhou um ofício à diretoria do ACA cobrando um aluguel de mais de R$ 1,3 milhão pelo prédio onde funciona a escola de aviação, que hoje enfrenta dificuldades financeiras, atrasando até o pagamento dos colaboradores.

A direção do ACA contesta judicialmente essa cobrança de aluguel de um prédio construído pelo próprio aeroclube.

“Nossa sobrevivência está ameaçada. Administramos com dificuldades, controlando custos, com problemas para pagar a folha, mas mantendo a escola funcionando enquanto aguardamos a Justiça. O Aeroclube do Amazonas não precisa de favores, precisa de Justiça”, declara o tesoureiro, que é aviador e trabalha no aeroclube há mais de 40 anos.

Aeroclube de Manaus passa a ser administrado pela Infraero - Portal Norte

Disputa fundiária

A disputa fundiária entre a União e o Aeroclube do Amazonas, que agora ameaça a continuidade da entidade, remonta aos primeiros tempos da aviação brasileira.

Naquela época, era essencial formar pilotos para a 2ª Guerra Mundial, e o empresário e jornalista Assis Chateaubriand, do grupo Diários Associados, liderou uma campanha para a criação de aeroclubes com escolas de aviação em todos os estados do pais.

Com a doação de um pequeno avião, Chateaubriand incentivava a fundação dos aeroclubes. No Amazonas, em 1940, o então interventor federal Álvaro Maia assumiu a missão e desapropriou três glebas. Inclusive, ele enviou uma prestação de contas a Getúlio Vargas sobre a decisão.

“Em terreno cedido para este fim, no bairro de Flores, a cinco quilômetros da cidade, servido por linha de bonde e rodovia, foi construído, pelo Estado, um campo de aviação, entregue ao Aero Clube local”, escreveu Álvaro. “Portanto, o aeroporto de Flores foi feito pelo Estado, não pela União, em terreno de terceiros”, destaca Francimar Sampaio.

Na época da construção, as glebas pertenciam e estavam devidamente registradas em cartórios de Manaus, a Bernardino de Sena Souza, Francisco Flores Filho e Aurélio Barroso de Sá. No entanto, a interventoria de Álvaro Maia não fez a matrícula do novo imóvel formado a partir dos três terrenos.

Ainda assim, o Aeroclube do Amazonas começou a operar na área com a autorização do Governo do Estado até que, durante a Ditadura Militar, o presidente Ernesto Geisel, em setembro de 1976, determinou a matrícula, em nome da União, de todos os aeroportos brasileiros, incluindo o de Flores.

Apesar dessa decisão, a administração do aerporto permaneceu sob responsabilidade do Aeroclube do Amazonas por meio de sucessivas concessões feitas pelos governos, tanto no período da Ditadura quanto no democrático.

Com a privatização de aeroportos, como o Eduardo Gomes, a Infraero perdeu sua função e o Ministério de Portos e Aeroportos transferiu servidores, que seriam demitidos, para administrar estruturas como a do Aeroclube do Amazonas.

A direção do Aeroclube ingressou com ações judiciais questionando a matrícula feita no governo Geisel, por meio do decreto 78.911/1976, uma vez que o próprio decreto exigia a inexistência de outros registros para o mesmo imóvel, o que não é o caso deste aeroporto, cujas matrículas estão em nome de Bernardino, Flores e Aurélio Sá.

Na peça judicial, o Aeroclube do Amazonas argumenta que o decreto não obedece à Lei de Registros Públicos, de 1973, que estabelece critérios que não foram seguidos.

A banca de advocacia que representa o Aeroclube no processo reconhece que a União pode reivindicar a posse do imóvel por interesse coletivo, mas para isso deve pagar as devidas indenizações ao antigo proprietário, o Aeroclube do Amazonas, que construiu todas as estruturas no local.

“Além disso, a Infraero não pode tomar decisões administrativas, como rescindir contratos com empresas que alugam hangares ou realizar licitações, como a do estacionamento, enquanto há uma disputa judicial em andamento”, afirmam os advogados.

Pátio para estacionamento de aeronaves do ACA Aeroclube do Amazonas -  bairro Flores | Pulsar Imagens | Banco imagens do Brasil

Site da Infraero destaca a importância

No site da Infraero, o Aeroporto de Flores é descrito como uma estrutura importante para atender Manaus, os municípios do interior e a formação de profissionais:

“O Aeródromo de Flores está localizado a cerca de seis km do centro de Manaus. É sede do Aeroclube do Amazonas (ACA), fundado em 1940 com o intuito de formar pilotos familiarizados com as características da Região Amazônica. Além de promover a aviação civil, havia também o interesse em fortalecer a defesa aérea na região, que começava a se destacar pela sua importância econômica, ligada à indústria local da borracha”, diz o site da estatal.

“Atualmente, o aeródromo abriga uma escola de paraquedismo, além de diferentes empresas de táxi aéreo, sendo de grande importância social para a aviação regional da Amazônia, pois auxilia as cidades do interior no transporte de passageiros, correios, carga a granel, suprimentos e numerários bancários, além de sediar a principal escola de pilotos e tripulantes, entre outros cursos na carreira de aeronauta”, completa.

Dados oficiais:

  • Área total do Sítio Aeroportuário: 357.000 m²
  • Pista de pousos e decolagens: 799m x 30m
  • Área total do pátio de aeronaves: 8.916 m²
  • Horário de funcionamento: 6h às 18h (não há operações noturnas)
  • Tipo de aviação que opera no aeroporto: Aviação Geral
  • Código de identificação ICAO: SWFN
  • Distância até as principais redes hoteleiras: 3 a 8 quilômetros
  • Distância até o hospital de emergência mais próximo (UPA): 4 quilômetros
  • Distância até a rodoviária da cidade: Menos de 500 metros

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